terça-feira, 29 de março de 2011

VI Seminário Nacional de Psicologia e Políticas Públicas

 


11/05/2011
Centro de Convenções
Salvador - Bahia

Programação

9h – Abertura Oficial
Humberto Verona – presidente do Conselho Federal de Psicologia

9h30 – Conferência
Análise da Conjuntura das Políticas Públicas e Sociais na América Latina

10h30 – Mesa Redonda
Democracia e Participação Social

14h – Mesa Redonda
Uma agenda estratégica para o futuro da Psicologia

15h – Debate

16h – Conferência
A política da ciência e a democracia: poder, sociedade e direitos

17h – Encerramento

Saiba mais: VI Seminário de Psicologia e Políticas Públicas

segunda-feira, 21 de março de 2011

quarta-feira, 16 de março de 2011

O Gigolô dos Negros

O gigolô dos negros

Jorge Portugal Educador e poeta secretaria@jorgeportugal.com.br



O Estado da Bahia é um histórico gigolô dos negros. O Estado inteiro e, principalmente, sua capital sempre se venderam ao resto do País e ao exterior pela pujança cultural de sua matriz africana. Alguém pode argumentar que na região do semiárido não é tanto assim, que no sertão há uma esmaecida presença do negro e que tudo isso é Bahia também. Mas eu respondo, lembrando que ainda não é pelos belos repentes sertanejos que o mundo se curva à musicalidade brasileira e sim pelo samba e suas variáveis, pelas canções de Caymmi e pelo canto de João. Durante 350 anos, a preguiça do explorador eurodescendente foi garantida pelos braços escravos dos negros na lavoura, na cozinha e nas construções. O azulejo era português, o desenho arquitetônico, às vezes também, mas o suor era negro, o trabalho braçal tinha cor.
Na culinária, não é a rapadura e a carnede-sol (deliciosas!) que seduzem paladares extra-Bahia. É o acarajé, o caruru, o vatapá, enfim, as comidas de orixás, carregadas de cultura no seu tempero e tecnologia negra no seu preparo. Na expressão corporal, a capoeira, espalhada pelo mundo, faz mais pela difusão da língua portuguesa do que todas as embaixadas brasileiras reunidas no planeta. Na literatura, sobretudo a literatura de Jorge e João Ubaldo, são figuras como Gabriela, Pedro Arcanjo, Nego Leléu, Tieta, Maria da Fé, que incendeiam o imaginário dos leitores do mundo e fixam a poesia e a luta de tantos iguais, de carne e osso, que aqui vivem numa sanha sem trégua para conquistar dignidade e respeito.
Enfim, estamos em um Estado (e uma cidade) que deve tudo o que move sua história, economia e cultura ao povo negro e suas invenções geniais. Não importa que a pele da cantora seja mais clara e o seu trio elétrico high-tec. A música que anima o Carnaval e que garante o seu estrondoso sucesso foi composta por um negro. Que continua anônimo, por sinal. Então, cara-pálida, quem é você para querer desancar Márcio Vítor em sua própria casa e Carnaval? Respeite-o e respeite a história desse povo que trabalha sem férias há 500 anos para que você e assemelhados possam “brincar de ser brancos” na Bahia.

O Mercado Vence o Racismo

O mercado vence o racismo


Entrevista - Walter Williams
O economista diz que as ações afirmativas prejudicam os negros ao reforçar estereótipos de inferioridade e defende a liberdade econômica como arma contra a desigualdade racial

André Petry - Páginas Amarelas, Revista Veja, Edição 2207 - 9 de março de 2011

"Os negros, em geral, estão muito melhor hoje do que há meio século. Mas os negros mais pobres estão pior" (Gilberto Tadday)


Walter Williams é um radical. Na juventude, preferia o incendiário Malcolm X ao pacifista Martin Luther King. Hoje, aos 74 anos, Williams admira os dois líderes negros, repudia a violência e se define como um libertário radical, como os americanos se referem aos que se opõem ao excesso de ativismo do estado e propugnam mais liberdade individual. Fiel ao seu ideário, é contra ações afirmativas e cotas raciais, e diz que o melhor instrumento para vencer a desigualdade racial é o livre mercado: “A economia de mercado é o grande inimigo da discriminação”. Criado pela mãe na periferia de Filadélfia, Williams acaba de publicar uma autobiografia em que narra sua trajetória da pobreza à vida de professor universitário (desde 1980, leciona economia na Universidade George Manson, na Virgínia). Com 1,98 metro de altura, voz de barítono, bom humor, ele demonstra muita coragem nesta entrevista.

Quem lê sua autobiografia fica com a impressão de que ser negro nos Estados Unidos das décadas de 40 e 50 era melhor do que ser negro hoje.Claro que os negros estão muito melhor agora, mas não em todos os aspectos. Hoje, se os negros americanos fossem uma nação à parte, seriam a 15ª mais rica do mundo. Entre os negros americanos, há gente riquíssima, como a apresentadora Oprah Winfrey. Há famosíssimos como o ator Bill Cosby, que, como eu, vem de Filadélfia. Colin Powell, um negro, comandou o Exército mais poderoso do mundo. O presidente dos Estados Unidos é negro. Tudo isso era inimaginável em 1865, quando a escravidão foi abolida. Em um século e meio, fizemos um progresso imenso, ao contrário do que aconteceu no Brasil ou no Caribe, onde também houve escravidão negra. Isso diz muito sobre os negros americanos e sobre os Estados Unidos.

Em que aspectos a vida dos negros hoje é pior?Cresci na periferia pobre de Filadélfia entre os anos 40 e 50. Morávamos num conjunto habitacional popular sem grades nas janelas e dormíamos sossegados sem barulho de tiros nas ruas. Sempre tive emprego, desde os 10 anos de idade. Engraxei sapatos, carreguei tacos no clube de golfe, trabalhei em restaurantes, entreguei correspondência nos feriados de Natal. As crianças negras de hoje que vivem na periferia de Filadélfia não têm essas oportunidades de emprego. No meu próximo livro, Raça e Economia, que sai no fim deste mês, mostro que em 1948 o desemprego entre adolescentes negros era de 9,4%. Entre os brancos, 10,4%. Os negros eram mais ativos no mercado de trabalho. Hoje, nos bairros pobres de negros, por causa da criminalidade, boa parte das lojas e dos mercados fechou as portas. Outra mudança dramática é a queda na qualidade da educação oferecida às crianças negras e pobres. Atualmente, nas escolas públicas de Washington, um negro com diploma do ensino médio tem o mesmo nível de proficiência em leitura e matemática que um branco na 7ª série. Os negros, em geral, estão muito melhor agora do que há meio século. Mas os negros mais pobres estão pior.

O estado de bem-estar social, com toda a variedade de benefícios sociais criados nas últimas décadas, não ajuda a aliviar a situação de pobreza dos negros de hoje?Todos os economistas, sejam eles libertários, conservadores ou liberais, concordam que sempre cai a oferta do que é taxado e aumenta a oferta do que é subsidiado. Há anos, os Estados Unidos subsidiam a desintegração familiar. Quando uma adolescente pobre fica grávida, ela ganha direito a se inscrever em programas habitacionais para morar de graça, recebe vale-alimentação, vale-transporte e uma série de outros benefícios. Antes, uma menina grávida era uma vergonha para a família. Muitas eram mandadas para o Sul, para viver com parentes. Hoje, o estado de bem-estar social premia esse comportamento. O resultado é que nos anos da minha adolescência entre 13% e 15% das crianças negras eram filhas de mãe solteira. Agora, são 70%. O salário mínimo, que as pessoas consideram uma conquista para os mais desprotegidos, é uma tragédia para os pobres. Deve-se ao salário mínimo o fim de empregos úteis para os pobres. A obrigação de pagar um salário mínimo ao frentista no posto de gasolina levou à automação e ao self-service. O lanterninha do cinema deixou de existir não porque adoramos tropeçar no escuro do cinema. É por causa do salário mínimo. Na África do Sul do apartheid, os grandes defensores do salário mínimo eram os sindicatos racistas de brancos, que não aceitavam filiação de negros. Eles não escondiam que o salário mínimo era o melhor instrumento para evitar a contratação de negros, que, sendo menos qualificados, estavam dispostos a trabalhar por menos. O salário mínimo criava uma reserva de mercado para brancos.

As ações afirmativas e as cotas raciais não ajudaram a promover os negros americanos?A primeira vez que se usou a expressão “ação afirmativa” foi durante o governo de Richard Nixon (1969-1974). Os negros naquele tempo já tinham feito avanços tremendos. Um colega tem um estudo que mostra que o ritmo do progresso dos negros entre as décadas de 40 e 60 foi maior do que entre as décadas de 60 e 80. Não se pode atribuir o sucesso dos negros às ações afirmativas.

As ações afirmativas não funcionam?Os negros não precisam delas. Dou um exemplo. Houve um tempo em que não existiam jogadores de basquete negros nos Estados Unidos. Hoje, sem cota racial nem ação afirmativa, 80% são negros. Por quê? Porque são excelentes jogadores. Se os negros tiverem a mesma habilidade em matemática ou ciência da computação, haverá uma invasão deles nessas áreas. Para isso, basta escola, boas escolas, grandes escolas. Há um aspecto em que as ações afirmativas são até prejudiciais. Thomas Sowell, colega economista, tem um estudo excelente sobre o assunto. Mostra como os negros se prejudicam com a política de cotas raciais criada pela disputada escola de engenharia do Instituto de Tecnologia de Massa-chusetts (MIT), uma das mais prestigiosas instituições acadêmicas dos Estados Unidos. Os negros recrutados pelo MIT estão entre os 5% melhores do país em matemática, mas mesmo assim precisam fazer cursos extras por alguns anos. Isso acontece porque os brancos do MIT estão no topo em matemática, o 1% dos melhores do país. Os negros, mesmo sendo muito bons, estão abaixo do nível de excelência do MIT. Mas eles podiam muito bem estudar em outras instituições respeitáveis, onde estariam na lista dos candidatos a reitor e sem necessidade de cursos especiais. Por causa de ações afirmativas, muitos negros estão hoje em posição acima de seu potencial acadêmico. Se você está aprendendo a lutar boxe e sua primeira luta é contra o Mike Tyson, você está liquidado. Você pode ter excelente potencial para ser boxeador, mas não dá para começar contra Tyson. As ações afirmativas, nesse sentido, são cruéis. Reforçam os piores estereótipos raciais e mentais.

O senhor já teve alguma experiência pessoal nesse sentido?Quando eu dava aula na Universidade Temple, em Filadélfia, tive uma turma com uns trinta alunos, todos brancos, à exceção de um. Nas primeiras aulas, eles me fizeram uma bateria de perguntas complexas. Você pode achar que era paranoia minha, mas eu sei que o objetivo deles era testar minhas credenciais. A cada resposta certa que eu dava, eu podia ver o alívio no rosto do único aluno negro da classe. De onde vinha esse sentimento, esse temor do aluno negro de que seu professor, sendo negro, talvez não fosse suficientemente bom? Das ações afirmativas. Não entrei na universidade via cotas raciais. Por causa delas, a competência de muitos negros é vista com desconfiança.

Num país como o Brasil, onde os negros não avançaram tanto quanto nos Estados Unidos, as ações afirmativas não fazem sentido?A melhor coisa que os brasileiros poderiam fazer é garantir educação de qualidade. Cotas raciais no Brasil, um país mais miscigenado que os Estados Unidos, são um despropósito. Além disso, forçam uma identificação racial que não faz parte da cultura brasileira. Forçar classificações raciais é um mau caminho. A Fundação Ford é a grande promotora de ações afirmativas por partir da premissa errada de que a realidade desfavorável aos negros é fruto da discriminação. Ninguém desconhece que houve discriminação pesada no passado e há ainda, embora tremendamente atenuada. Mas nem tudo é fruto de discriminação. O fato de que apenas 30% das crianças negras moram em casas com um pai e uma mãe é um problema, mas não resulta da discriminação. A diferença de desempenho acadêmico entre negros e brancos é dramática, mas não vem da discriminação. O baixo número de físicos, químicos ou estatísticos negros nos Estados Unidos não resulta da discriminação, mas da má formação acadêmica, que, por sua vez, também não é produto da discriminação racial.

Qual o meio mais eficaz para promover a igualdade racial?Primeiro, não existe igualdade racial absoluta, nem ela é desejável. Há diferenças entre negros e brancos, homens e mulheres, e isso não é um problema. O desejável é que todos sejamos iguais perante a lei. Somos iguais perante a lei, mas diferentes na vida. Nos Estados Unidos, os judeus são 3% da população, mas ganham 35% dos prêmios Nobel. Talvez sejam mais inteligentes, talvez sua cultura premie mais a educação, não interessa. A melhor forma de permitir que cada um de nós — negro ou branco, homem ou mulher, brasileiro ou japonês — atinja seu potencial é o livre mercado. O livre mercado é o grande inimigo da discriminação. Mas, para ter um livre mercado que mereça esse nome, é recomendável eliminar toda lei que discrimina ou proíbe discriminar.

O senhor é contra leis que proíbem a discriminação?Sou um defensor radical da liberdade individual. A discriminação é indesejável nas instituições financiadas pelo dinheiro do contribuinte. A Universidade George Manson tem dinheiro público. Portanto, não pode discriminar. Uma biblioteca pública, que recebe dinheiro dos impostos pagos pelos cidadãos, não pode discriminar. Mas o resto pode. Um clube campestre, uma escola privada, seja o que for, tem o direito de discriminar. Acredito na liberdade de associação radical. As pessoas devem ser livres para se associar como quiserem.

Inclusive para reorganizar a Ku Klux Klan?Sim, desde que não saiam matando e linchando pessoas, tudo bem. O verdadeiro teste sobre o nosso grau de adesão à ideia da liberdade de associação não se dá quando aceitamos que as pessoas se associem em torno de ideias com as quais concordamos. O teste real se dá quando aceitamos que se associem em torno de ideais que julgamos repugnantes. O mesmo vale para a liberdade de expressão. É fácil defendê-la quando as pessoas estão dizendo coisas que julgamos positivas e sensatas, mas nosso compromisso com a liberdade de expressão só é realmente posto à prova quando diante de pessoas que dizem coisas que consideramos absolutamente repulsivas.

O senhor exige ser chamado de “afro-americano”?Essa expressão é uma idiotice, a começar pelo fato de que nem todos os africanos são negros. Um egípcio nascido nos Estados Unidos é um “afro-americano”? A África é um continente, po-voado por pessoas diferentes entre si. Os vários povos africanos estão tentando se matar uns aos outros há séculos. Nisso a África é idêntica à Europa, que também é um continente, também é povoada por povos distintos que também vêm tentanto se matar uns aos outros há séculos.

A presença de Obama na Casa Branca não ajuda os negros americanos?Na autoestima, talvez. Mas não por muito tempo, o que é lamentável. Em 1947, quando Jackie Robinson se tornou o primeiro negro a jogar beisebol na liga profissional, ele tinha a obrigação de ser excepcional. Hoje, nenhum negro precisa ser tão bom quanto Robinson e não há perigo de que alguém diga “ah, esses negros não sabem jogar beisebol”. No caso de Obama, vale a mesma coisa. Por ser o primeiro negro, ele não pode ser um fracasso. O problema é que será. Aposto que seu governo, na melhor das hipóteses, será um desastre igual ao de Jimmy Carter. Vai ser ruim para os negros.

Semana do Calouro da UFBA - 2011.1

Como parte das atividades da Semana dos Calouros de Psicologia da Universidade Federal da Bahia, o Diretório Acadêmico de Psicologia da UFBA estará realizando duas atividades de interesse coletivo.

Primeiramente, acontece na quarta-feira, às 11h, no auditório da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFBA, em São lázaro um Cine-Debate, conjuntamente com os estudantes de História, com a apresentação do documentário recém-lançado "Cortina de Fumaça", visando discutir questões como Criminalização e Legalização da Maconha.

A segunda estapa será  uma mesa de discussão intitulada Psicologia na Contramão, que acontecerá no dia 18/03 (sexta-feira), às 9h, no auditório do Conselho Regional de Psicologia da Bahia - Federeção. O objetivo da mesa é apresentar aos estudantes lugares onde a Psicologia está presente mas pouco se conhece, ou pouco se discute, demonstrando que outras possibilidades de inserção são possíveis e factuais. Nesse sentido, na mesa teremos os temas:
 
- Psicologia na Saúde Pública
(Com Mônica Lima, psicóloga e professora do Instituto de Psicologia da UFBA)

- Psicologia das Emergências e Desastres
(Com Fernanda Vidal, psicóloga e mestranda em Ciências Sociais pela UFBA)

- Psicologia das Relações Raciais
(Com Valter da Mata, psicólogo, presidente do Conselho Regional de Psicologia da Bahia e professor da Faculdade Metropolitana de Camaçari)

- Psicologia na Mobilidade Urbana, Transporte e Trânsito
(Com Carlita Moraes, psicóloga e professora da Pós-Graduação da Faculdade São Bento da Bahia)

terça-feira, 15 de março de 2011

REFLEXÕES E DEBATES: RACISMO E SEXISMO

O Colegiado do Curso de Serviço Social  do Instituto de Psicologia em parceria com o Centro de Estudos Afro-Orientais – CEAO, promoverão de 21 à 25 de março o REFLEXÕES E DEBATES: RACISMO E SEXISMO em comemoração ao Dia Internacional pela Eliminação da Discriminação Racial.  O dia 21 de Março foi escolhido como  marco em virtude ao massacre ocorrido em Joanesburgo, na África do Sul, em 1960, quando manifestantes faziam um protesto contra a Lei do Passe , signo do sistema do Aparthaid, e foram fortemente reprimidos pelas forças policiais locais. Esta atividade, entre outros objetivos, visa promover uma discussão e reflexão mais ampla acerca da temática da discriminação racial, racismo, gênero e xenofobia que mesmo diante de tantas ações de luta e enfrentamento ainda permeiam as relações sociais cotidianas.

Programação abaixo.
As inscrições serão realizadas no local.
Haverá certificação com participação a partir de 75% das atividades.


Aula Inaugural Instituto Steve Biko - 2011

quarta-feira, 2 de março de 2011

Camarotes e Multidões

28 de Fevereiro de 2011 - por Emiliano José

Camarotes e multidões

Emiliano José*

É tempo de viver a folia. Mas por que não pensar também na organização da folia? No que acontece com as diversas camadas da população? No tipo de participação que o carnaval possibilita? Na utilização do espaço público? Sei que quando se toca no assunto, sempre há a reação: isso é papo dos conservadores, dos que não acompanham as inevitáveis mudanças. Mas quero ousar discutir, para além das reações. Ou até para que elas venham e a discussão se estabeleça, se é que se estabelecerá. Porque no mais das vezes o que se quer é o silêncio diante de assuntos explosivos. Especialmente quando o tema envolve negócios, e bons negócios.

Meu amigo Antonio Risério, há poucos dias, tratou da vida em condomínios. Da recusa da vida na cidade. Do apartheid que vai se estabelecendo sem que as pessoas se apercebam de que com isso o direito à cidade está sendo fraudado. Nessas pequenas comunidades isoladas, para citar apenas um aspecto, nossas crianças vão se formando sem a multiplicidade de convivências que o mundo urbano pode propiciar. A vizinhança se restringe àquelas poucas pessoas do meu condomínio. Risério tratou do assunto bem, e eu me intrometo de passagem para elogiar o tratamento que ele deu e para tratar de outra espécie de apartheid.

São vários os apartheids originados da organização do carnaval em Salvador nos últimos anos. Passa ano, vem ano e eles só se agravam. Discuto isso desde o início de 2000. Falo sempre dos cordeiros – que nome, hein? – submetidos a um regime de trabalho semi-escravo, negros convertidos em guardiães dos brancos bem nascidos protegidos por cordas, as cordas que eles sustentam, afastando a multidão ignara que os pressiona de fora. A multidão a que eles pertencem. Tem havido esforços para regulamentar a atividade, especialmente com a intervenção, nesse caso apropriada, do Ministério Público. Não muda, no entanto, o apartheid. De um lado a multidão de fora das cordas. De outro, os que pagam proteção e brincam no interior das cordas.

Muitos dos que brincam dentro das cordas nunca saem dali. Há turistas que chegam aos hotéis, embarcam nos ônibus, descem protegidos por seguranças, entram nas cordas, e dali voltam para suas camas, sem sequer interagir com Salvador, com a complexidade da cidade. Com esse tipo de organização do espaço, com privilégio para tais blocos, o chamado folião pipoca é obviamente marginalizado. Tem, mais do que nunca, que buscar seu espaço a cotoveladas, contra as cordas, contra a óbvia privatização do espaço que deveria ser de todos, e cada vez menos é de todos. Ainda bem que o governo do Estado tem dado força ao Programa Ouro Negro, valorizando os blocos de matriz africana.

A outra praga – me desculpem a expressão – é a dos camarotes. Outro óbvio apartheid. Aqui se pretende, quem sabe, organizar o carnaval espetáculo. Uma platéia seleta que vê o trio passar, e que bebe, e que come, e que paga, e paga alto, para fruir o espetáculo. E aqui há a clara, claríssima pretensão de distinguir-se da multidão, de não se misturar com o povo, de afastar-se dos odores, suores, transpirações, pega-pega das multidões, dos pobres que se embriagam metafórica ou verdadeiramente com a beleza do carnaval, mesmo que lhe tentem subtrair espaço de todas as maneiras. De certa maneira, que me desculpem novamente por essa outra expressão que pode parecer ofensiva, voltamos à famosa luta de classes.

Nada de misturas. Elas são inconvenientes. Os palácios se reproduzem em ambientes cinematográficos, devidamente aromatizados, a depender do gosto do freguês, o ar condicionado evitando ou minimizando o suor. E lá embaixo, sim, porque a multidão fica lá embaixo, os pobres pulam, e se divertem, e se envolvem numa alegria extraordinária, apesar de tudo, e ainda bem que seja assim, que tenhamos um povo com tanta capacidade para fruir a vida, mesmo que lhe roubem o espaço público, espaço que deveria ser inteiramente dele. Eu torço para que um dia no carnaval da Bahia as cordas sejam abolidas, as praças e as ruas sejam do povo, não haja embaixo e em cima, e que as multidões sejam as donas da cidade nos dias da festa. 

*jornalista, escritor, deputado federal (PT/BA)

Abertura do Observatório do carnaval 2011